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Casos

Durante a existência são presenciados muitos fatos que nos escapam da memória totalmente. Alguns, porém, são relembrados quase inteiros, embora de outros restem resquícios de lembranças. Assistindo ou acompanhando pelas notícias dos órgãos de imprensa, é comum verificarmos que muitos desses acontecimentos assistidos ou colhidos através dos órgãos de comunicação se assemelham com outros tantos acontecidos conosco. Abaixo vários desses casos que me foram contados, alguns passados bem longe de Salvador e que parecem encaixar-se em parte talvez, com outros acontecidos por cá.

      Certa vez um comerciante progressista estava à procura e uma nova sede para sua empresa, cujo crescimento exigia maior espaço. Achou a ex-sede de uma grande empresa, agora com uma monumental e luxuosa sede, fora seu colega – e talvez amigo – nos tempos pretéritos da mocidade, procurou comunicar-se diretamente com ele. Já estava a par de preços e condições da venda do imóvel, mas gostaria de ter um entendimento pessoal com o chefão. Afinal, lembrando-se dos velhos tempos, poderia este facilitar alguma coisa em parcelamento. Através do telefone não houve jeito d combinar encontro, pois nem ao menos ele podia vir ao telefone, atarefadíssimo que parecia estar, segundo informava a telefonia, ora em reunião, ora saíra naquele instante, ora não chegara ainda. Nem ao menos manifestara conhecer quem lhe procurava. Na verdade, logo depois, o possível comprador encontrava terreno em melhor localização e construíra, de acordo com o seu projeto, uma sede muito melhor. Basta dizer – depois se verificou – que a tal ex-sede era construída sobre terreno que se alagava nos fortes invernos. Sorte foi não ter pegado tamanha prebenda.

     Penso que toda firma procura escolher, entre seus funcionários subalternos, aqueles que demonstram mais interesse em colaborar para coloca-los em posição de relevo. Assim se procura fazer em nossa firma. Às vezes se erra, às vezes se acerta. Mas um amigo me contou que, na sua firma, um funcionário de destaque, e com cerca de 20 anos de trabalho na casa, solicitou que o indenizasse para, com a indenização, adquirir uma casa de morada, embora já dispusesse de um apartamento modesto. Não era optante e tinha estabilidade. Queria ser indenizado optando pelo FGTS, deixando a estabilidade mas sem perder o emprego. Pois não – disse o patrão. Feitos os cálculos, o patrão mostrou que afirma só poderia indenizá-lo três ou quatro meses adiante, por falta de numerário. É preciso que o leitor, se for leigo no assunto, saiba que a indenização de um funcionário só pode ser feita inteira com dinheiro vivo ou cheque nominal visado. O Ministério do Trabalho não homologa de outra maneira.

     - Ah! Mas eu já tenho a casa, por sinal muito boa – disse o funcionário – e tenho que pagar logo este mês e o dono só vende à vista!

     - Pergunte  a ele – retrucou o patrão – se ele não aceita o pagamento, sem acréscimo, a metade à vista e o restante em três promissórias de 30, 60 e 90 dias.

     Consultado o vendedor, aceitou se as promissórias tivessem o aval do patrão. Mas podia ser, que o Ministério do trabalho não aceita. Com promissórias? Não podia ser, que o Ministério do Trabalho não aceita. Combinou-se então indenizaria com dois cheques, ambos visados, só que um deles, na volta do ministério, seria anulado e trocado por três promissórias de valor equivalente, para os vencimentos aceitos pelo vendedor, emitidas pelo patrão em favor deste. Assim foi feito, com a particularidade de que a anulação do cheque assim como a carta dirigida pela firma ao banco solicitando essa anulação foram confiados ao próprio funcionário. Pois bem, o funcionário tirou xerox da carta antes de apresentá-la ao banco e depois tirou do cheque anulado antes de devolvê-lo ao patrão, na intenção, como se viu depois, de entrar com uma ação declarando que o seu pagamento teria sido parcial. Isto é, que não tinha sido indenizado devidamente. De fato, quando o rapaz mostrou desejos de se afastar da firma definitivamente, no que concordou seu patrão, e foi indenizado já agora de acordo com a lei do FGTS, com pouco de demitido movia uma ação para ser reindenizado de uma fortuna, do tamanho quase do capital da firma. Inclusive chegou a declarar que de sociedade com um outro fanfarrão do comércio tomaria conta da dita firma. Quando burrice! Esqueceu-se o rapaz que “ainda existem juízes em Berlim”. A ação percorreu seus trâmites normais. O rapaz, muito burro, se esqueceu que na escritura de compra e venda de sua bela casa constara bem claro o pagamento da parte à vista e da parte em três promissórias emitidas pelo seu patrão no valor exato cheque anulado. Quando acabou de mentir, o juiz mostrou-lhe a escritura e o seu registro líquido com promissórias emitidas e resgatadas pelo seu patrão. Gaguejou e empalideceu... Não houve necessidade de o juiz dizer que ele mentia. Não quero defender os patrões nem acusar os empregados. Aliás, sei o quanto muito empregado pode sofrer de seus patrões. Mas a má fé e a desonestidade deste rapaz ultrapassou tudo, pois não nasceu de um momento de necessidade ou aperto o que se aceita, embora não se justifique. Nasceu no momento em que ele estava recebendo um grande favor; na ocasião em que o patrão o ajudava a adquirir uma casa, ele já preparava a documentação que viria a usar 10 anos depois. Felizmente os desonestos não são muitos inteligentes, pois se fossem bem inteligentes não precisariam ser desonestos.

     Vamos a casos comigo mesmo. Há muito tempo – Nos tempos em que eu dirigia a firma -, empreguei um rapaz que, conforme o seu currículo, deveria ser possuidor de uma extraordinária experiência em balcão de farmácia. Os lugares onde se empregara e o tempo de serviço indicavam isso. Basta dizer que já não era uma experiência estadual mas federal. Isto é, vinha de outros estados. Pois bem, esse rapaz, vendo o nosso estoque de produtos com prazo de validade vencidos e separados para destruição ou devolução, perguntou:

     - Que comissão o senhor me dá pra eu colocar tudo pra fora?

     - O quê?! Respondi – o senhor está louco, isso não pode ser vendido de modo algum.

     - Pois eu vendo isso tudo!

     - Onde aprendeu a fazer assim?!

     Ele me indicou as casas onde aprendeu a agir desse modo. Logo o demiti, alegando excesso de funcionários. Por aí se vê que maus patrões deseducam seus funcionários, ensinando-lhes práticas desonestas. Há mesmo patrões que autorizam seus gerentes a comprar no balcão qualquer mercadoria oferecida, naturalmente baratíssima, com o que são incentivados os balconistas de outras lojas  do mesmo ramo a furar para lhes vender barato. Contava-se aqui em Salvador – no tempo em que era moda aplicar cálcio na veia contra gripe – que um proprietário de farmácia adquiriu no balcão 10 caixas com 100 ampolas do referido. A seguir chamou um rapaz novato do depósito para conduzir a mercadoria. O rapaz perguntou o que tinha havido com aquelas caixas de cálcio.

     - É mercadoria adquirida agora.

     - Agora?! Essa mercadoria estava no depósito a semana passada e está toda marcada aqui debaixo das tampas das caixas com minha letra.

     E mostrou ao patrão. O rapazinho, novato, não sabia que o hábito de comprar furto já provocara a formação de uma quadrilha interna na casa, que furtava e mandava vender novamente ao próprio dono. Se os que compram furto soubessem ao menos que  estão incentivando seus próprios funcionários a praticarem furto, deixariam de fazê-lo no interesse de deixar de perder muito do que julgam estar ganhando, já que são insensíveis ao valor moral da honestidade.

     Vejamos agora um caso passado pertinho de nós. Certa vez um órgão de comunicação insinuou que a nossa firma estaria com vistas a monopolizar o mercado de farmácia em Salvador. Ora, o número de filiais da nossa firma não atingia, como não atingi hoje. 10% do número de estabelecimento farmacêuticos existentes em Salvador. Como então haver monopólio? É verdade que estes 10% de estabelecimentos tem um poder de serviços muito alto dentro do conjunto, mas não se pode conceber aí monopólio ou intenção de monopólio. Penso mesmo que se esses 10% controlassem mais de 80% da clientela de farmácia de Salvador ainda assim não seria monopólio. Aqui mesmo em Salvador existe um jornal, um dos mais acreditados no país, “A Tarde”, que publicou por essa época pesquisa levantada em que mostrava que o seu jornal era preferido por mais de 90% dos leitores de jornal. E na verdade ele domina não só leitores como os colocadores de publicidade. E nós podemos afirmar por acaso que “A Tarde” é monopolista? De modo algum. Essa posição ela conquistou através de muitos anos de trabalho e serviços prestados e dificilmente outro poderá alcançá-la. Pois bem, por que não podemos nós dizer o mesmo da nossa firma que, nesses 46 anos de existência, partindo de uma farmacinha do interior, chegou a essa posição conquistada palmo a palmo no trabalho, na perseverança e nos bons serviços!

Texto extraído do livro Bambanga (9° livro de memórias) de autoria de José Lemos de Sant’ Ana

Médico, Empresário, Escritor.

Texto digitado por Luzanira Fernandes

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