Um universo de sorte
O universo existe, é regido por leis e certos números denominados de
constantes cosmológicas. A força gravitacional tem um valor, a interação fraca
que une as partículas atômicas ente si também tem um valor expresso por um
número, a força eletromagnética tem outro número. É um fato admitido pelos
físicos que as leis da física não obrigam que tais constantes cosmológicas
assumam determinado valor. Esses valores poderiam ser outros, poderiam variar
ao infinito mesmo com as mesmas leis físicas que conhecemos.
Uma questão intrigante é que se uma constante
cosmológica do universo fosse diminuída em uma parte em um trilhão de partes,
então, a distribuição de matéria no universo seria diferente e a vida não
existiria. Observem que é semelhante a um homem com um trilhão de reais e que
se fosse tirado apenas um real do seu bolso, ele ficasse pobre. Não seria mais
rico por ter sido tirado um real, da mesma forma a vida não existiria se
qualquer um das várias constantes cosmológicas fosse alterada em uma parte
infinitamente pequena de si mesma. Muitos acham que tivemos uma sorte incrível
destas constantes serem as que são, pois, do contrário não existiríamos. Outros
desconfiam que não tivemos sorte, algo fez que tais constantes sejam estas adequadas
à vida. E a este "algo" denominaram Deus.
Os cientistas que possuem uma crença cristã
advogam que Deus construiu o universo de tal forma que pudesse ser possível a
existência da vida. Eu não sou cientista, nem nada parecido, mas tenho uma
idéia levemente diferente. As constantes cosmológicas são um fato, a precisão
absoluta de seus valores e que permitiram a existência de vida é outro fato.
Ateus e crentes concordam com isso. Uns creem na sorte, outros na providência
divina.
Vamos supor, hipoteticamente, que Deus exista e
sendo inteligente e todo poderoso criou o homem. Surgem questões intrigantes
nesta colocação. O universo tem 16 bilhões de anos... Por que Deus iria demorar
tanto tempo para criar o homem, a vida? O que estava esperando todo esse tempo?
Se as constantes cosmológicas e as leis da física possibilitaram o surgimento
do homem, por que este homem não surgiu logo? E porque fazer um universo tão
grande, com duzentos bilhões de galáxias para determinar que a vida surgisse
somente na Terra, deixando despovoado o restante do universo? Para que tanto
trabalho para resultar apenas no homem e ainda colocá-lo na última hora em uma
partícula do universo chamada Terra? Ateus como o físico Stephen Hawking
declaram que mesmo se Deus existisse, a Terra seria irrelevante para Deus. O
físico pode estar sendo presunçoso ao determinar o que Deus sentiria sobre a
Terra.
De fato, é um pouco forçado acreditar que o
universo seja como é apenas para dar origem ao homem. Talvez seja um esforço
muito grandioso. O mais justo é que existisse apenas a Terra e não o universo.
Se é para o universo servir ao homem, então, não precisaria ser tão grande, uma
espécie de latifúndio improdutivo. Bastaria a Terra ou no máximo o sistema
solar. Como resolver essa questão? Os ateus acreditam que já resolveram: não
existe Deus, o homem é um animal como outro qualquer e a vida surgiu por pura
sorte. Acredito, em acordo com o Espiritismo, que tanto a teologia e os
ateus se enganaram ou não acertaram completamente. Os teólogos ao darem
um valor desproporcional e acima do razoável ao homem e os ateus por se
diminuírem de forma triste e grosseira.
O Espiritismo postula que existiriam incontáveis
mundos habitados, sejam semelhantes à terra, sejam muito diversos. Existiria
também o mundo espiritual com um número de habitantes infinitamente superior à
Terra. O homem evoluiria até alcançar a condição de ser angélico. O mundo
espiritual existe de forma independente do mundo material. O universo físico
poderia deixar de existir e o mundo espiritual onde vivem os espíritos em nada
seria afetado.
O homem é um espírito encarnado, ligou-se
a um corpo adequado a uma experiência terrena, se encarnasse em outros mundos,
usaria corpos diferentes e outra forma para manifestar a sua
capacidade de viver e evoluir. Os espíritos superiores afirmam que a forma
humana é a forma padrão em todos os mundos, com certas diferenças que
revelariam a evolução específica dos habitantes desse mundo.
Antes de existir vida na Terra, já existia vida
no mundo espiritual, aliás, antes de existir o universo físico já existia
o universo extra-fisico. Deste mundo espiritual se originou todos os habitantes
da Terra e de qualquer outro mundo material. Deus não ficou parado por 16
bilhões de anos para somente depois criar Adão e Eva, tampouco fez o universo
de dimensões astronômicas para deleite exclusivo dos homens. A vida se
expande para outras dimensões, de forma grandiosa, bela e incompreensível
para nosso atual estágio de evolução. Não podemos conceber o universo atendo-nos
a um antropocentrismo primitivo. Um pouco de imaginação e de amor, talvez
alcance um pouco mais de compreensão, o que nosso orgulho e raciocínio limitado
não foi capaz de fazer de forma completa.
João Senna. Médico, escritor, palestrante, falecido em 2020
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